Empreendedorismo é o novo nome do subemprego

Atualizado em 24 de Março de 2020 às 11h43
Banco de imagens - ShutterStock

 

 

O avanço da tecnologia e a chegada dos aplicativos batizaram com um nome glamoroso o velho e onipresente trabalho informal. Os chamados empreendedores são, muitas vezes, motoristas ou entregadores de comida que não têm nenhum direito ou garantia em caso de acidente ou doença.

Segundo dados do IBGE, 38,4 milhões de pessoas, o que equivale a 41,1% da população economicamente ativa, é trabalhadora informal. Destes, 24,2 milhões são autônomos, e 80% não têm CNPJ. De cada dez pessoas que desistem de procurar emprego, quatro se encontram em uma situação na qual vivem de 'bicos' ou 'de expediente'. Destes, 19% prestam serviços gerais, 14% revendem produtos (14%) e 13% se dedicam à venda de comida, conforme aponta pesquisa da CNDL/SPC Brasil. A enquete abrangeu 604 desempregados com mais de 18 anos, de todas as classes sociais, em 27 capitais. Para eles, o importante é colocar comida na mesa, ou seja, qualquer renda é melhor do que nenhuma.

Fevereiro, que é considerado um mês fraco pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), este ano teve um recorde de inscritos nos seus cursos gratuitos a distância. Foram 140 mil pessoas que pretendem, ou necessitam, passar a ser empreendedores, um aumento de 51% em relação ao ano anterior. Nos 47 anos do Sebrae, 2019 foi o ano em que houve maior procura por informações sobre como abrir o próprio negócio (2,5 milhões de pessoas) e matrículas em cursos EaD (um milhão de pessoas).

Os desempregados transformados em microeempreendedores, agora, estão à mercê da chamada 'mão invisível do mercado'. A chegada de uma pandemia, que agora enfrentamos face ao avanço da Covid-19 causada pelo novo coronavírus, colocou o público consumidor em quarentena e ameaça arruinar o modo de sobrevivência de todo um grupo de pessoas que perderam seus empregos, justamente, em razão da crise do neoliberalismo.

Dupla vulnerabilidade

A pandemia vem expor uma situação pré-existente de desproteção que acompanha a escalada de empreendedorismo, acompanhada pela perda total de direitos trabalhistas. Usualmente sem contar com uma reserva financeira, motoristas de aplicativo não podem parar de trabalhar, aumentando assim as chances de contrair a doença; ao mesmo tempo, não podem contrair a doença porque não podem parar de trabalhar - o ciclo perverso é insustentável, porém os boletos e contas a pagar - entre elas, a prestação da bicicleta, o aluguel do carro - não estão de quarentena.

O governo anunciou, na quarta-feira (18), que irá destinar R$ 15 bilhões para oferecer a trabalhadores informais de baixa renda, durante 3 meses, um valor próximo ao do Bolsa-Família, de R$ 200 por mês. Algumas empresas também estenderam uma rede, embora fina, de proteção. A Uber anunciou na terça-feira (17) que irá pagar aos motoristas infectados ou com suspeita um valor calculado sobre a média de ganhos deste no último semestre. Os restantes, não apenas estão expostos ao risco de adoecer mas, também, funcionam na prática como possíveis vetores de disseminação do vírus.

O formato autoempreendedor é em essência precarizado, e portanto extremamente vulnerável às oscilações de mercado e surtos epidêmicos como o que temos atravessado. A única solução possível a essa massa de entregadores, vendedores, motoristas e outros é a articulação entre si para estabelecer alguma forma de organização. O novo modelo de trabalho, marcado pela intensificação da flexibilização das relações de emprego, explicitando a atual crise do capitalismo que visa explorar ainda mais os trabalhadores.

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