MCTIC limita recursos do CNPq para projetos apenas de áreas tecnológicas até 2023

Publicado em 26 de Março de 2020 às 18h32. Atualizado em 27 de Março de 2020 às 14h48

O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) publicou, na terça-feira (24), uma portaria na qual define suas prioridades para o período de 2020 a 2023, alinhadas ao Plano Plurianual da União (PPA). No documento, o MCTIC estabeleceu como prioritários projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovações voltados apenas para cinco áreas de tecnologia.

Com o argumento de “alavancar setores com maiores potencialidades para a aceleração do desenvolvimento econômico e social do Brasil e racionalizar o uso dos recursos orçamentários e financeiros programados pelo Governo Federal”, a Portaria nº 1.122 ignora as demais áreas de conhecimento. E reduz ainda mais o investimento público em áreas como ciências básicas, aplicadas, humanas e sociais, as quais também contribuem para o desenvolvimento da nação e para busca por soluções sustentáveis para os problemas da realidade brasileira. 

O MCTIC impõe, ainda, que a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), entidades vinculadas à pasta, “deverão promover os ajustes e adequações necessários nas respectivas linhas de financiamento e de fomento para incorporar em seus programas e ações as prioridades estabelecidas no documento”. Confira a portaria.

A portaria estabelece como prioritários, no âmbito no MCTIC, projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovações voltados para cinco áreas de tecnologias: Estratégicas; Habilitadoras; de Produção; para Desenvolvimento Sustentável; e para Qualidade de Vida. 

A área de Tecnologias Estratégicas contempla os setores espacial, nuclear, cibernética e segurança pública e de fronteira. Já Tecnologias Habilitadoras incluem inteligência artificial, internet das coisas (IoT), materiais avançados, biotecnologia e nanotecnologia. A área de Tecnologias de Produção abrange indústria, agronegócio, comunicações, infraestrutura e serviços. Em Tecnologias para o Desenvolvimento Sustentável estão cidades inteligentes, energias renováveis, bioeconomia, tratamento e reciclagem de resíduos sólidos, tratamento de poluição, monitoramento, prevenção e recuperação de desastres naturais e ambientais, além de preservação ambiental. A última área, de Tecnologias para Qualidade de Vida, envolve os setores de saúde, saneamento básico, segurança hídrica e tecnologias assistivas.

Para o ANDES-SN, a medida arbitrária e autoritária do MCTIC reproduz a visão obscurantista e elitista do governo atual de que a ciência tem apenas caráter utilitário, voltada apenas para o Capital, e de que pesquisas e produção do conhecimento nas áreas de ciências sociais e humanas são descartáveis.

O Sindicato Nacional defende a revogação imediata da portaria e denuncia que, mais uma vez, o governo federal ataca a produção de conhecimento no país, desconfigurando o caráter do CNPq como órgão de fomento a todas as áreas de pesquisa e produção científica. Além disso, retira os já poucos recursos destinados pelo CNPq às áreas de ciências básicas, humanas e sociais.

“A portaria 1.122 do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação, ao invés de simplesmente definir prioridades, consiste em mais uma etapa intensificada do processo de desmonte das ciências no Brasil. Mais amplamente falando, é um ataque à própria soberania nacional, uma vez que um dos seus sustentáculos é o domínio técnico e científico preterido pelo puro simples domínio da técnica dissociada dos processos de produção científica de conhecimento que inscrevem a totalidade dos saberes. Por exemplo, [a produção de saber] na área da ciência médica tem que ser acompanhada, para seu desenvolvimento e implementação, de uma análise sociológica, sócio-histórica e antropológica”, aponta Rodrigo Medina, 1º vice-presidente da Regional São Paulo do ANDES-SN.

Para o diretor do Sindicato Nacional, o desmembramento das ciências significa, dentro dessa perspectiva do fomento, a própria decomposição do conhecimento humano. “Portanto, é a reprodução de saberes para realidades submetidas a um modelo de capitalismo dependente”, conclui.

Diante do cenário atual, o ANDES-SN aponta que se faz urgente a revogação da Emenda Constitucional 95, a taxação de grandes fortunas e a suspensão do pagamento de juros e amortização da Dívida Pública, para que se consiga ampliar os recursos destinados a áreas como Saúde, Educação, Ciência e Tecnologia públicas, que se mostram fundamentais para buscar soluções aos diferentes problemas aprofundados pela pandemia do novo coronavírus.

Entidades representativas dos gestores em Ciência e Tecnologia, dos servidores do CNPq e do MCTIC também rechaçaram a decisão do ministério, sobre a qual alegam não terem sido consultados. “A portaria terá forte impacto no fomento as Ciências Sociais e nas Ciências Básicas, na medida em que estabelece como prioridade para financiamento apenas as pesquisas nas áreas tecnológicas. As consequências para a ciência de modo geral, e para aqueles campos do conhecimento que por sua natureza ou por sua dinâmica não estão atreladas de imediato a produção de tecnologias podem ser incomensuráveis”, apontam em nota conjunta o Sindicato dos Gestores em Ciência e Tecnologia (SinGCT), a Associação dos Servidores do CNPq (Ascon) e a Associação dos Servidores do MCTIC (ASCT).

Para as entidades, o atraso que determinações do MCTI impõe às pesquisas, seus centros de produção e seus pesquisadores, submetidos ao corte total ou redução drástica de financiamento, pode levar a um forte desequilíbrio entre os campos do conhecimento. Além disso, promover “um rebaixamento de nossa inserção no campo da produção mundial do conhecimento, na solução dos problemas nacionais e nos próprios objetivos buscados na Portaria”.

Vale destacar que também nesse mês de março, a Capes publicou portaria com novo método para destinação de bolsas que implicará em redução significativa do número de bolsas em diversos programas de pós-graduação nas universidades públicas brasileiras.

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